ENTREVISTA DE FREI GILVANDER À REVISTA ADISTA (Revista italiana, n. 26/2005).

 

Frei Gilvander participa de grandes lutas e sofre ameaças de morte

 

Segundo denúncia apresentada pela Comissão Pastoral da Terra – CPT - à Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, bem como DENÚNCIA-REPRESENTAÇÃO apresentada à Delegacia de Polícia Civil, ao DEOESP, na pessoa do Dr. Edson Moreira, e ao Chefe da Polícia Civil de Minas Gerais, Dr. Otto, frei Gilvander Moreira sofreu várias ameaças de morte ultimamente. Convém recordar que frei Gilvander é assessor da CPT, membro da coordenação do Movimento Capão Xavier Vivo, assessor das pastorais Sociais, das CEBs, CEBI, MST e SAB, além de ser professor de Exegese e Teologia Bíblica no ISTA, em Belo Horizonte/MG.

 

ADISTA: A sua atuação pastoral incomoda grandes interesses econômicos. Entre as grandes lutas de que você participa, parece que a luta pela preservação dos mananciais de abastecimento público de Capão Xavier, a luta contra a Mina de Capão Xavier, tem suscitado muita agressividade da parte de funcionários e adeptos da MBR. O que está acontecendo?

Frei Gilvander: "Em 2004, a mineradora MBR - Minerações Brasileiras Reunidas S/A –, após um processo de licenciamento viciado, atropelando uma série de leis ambientais, ameaçando mananciais de abastecimento público, começou a explotar 173 milhões de toneladas de minério de ferro de alto teor em Capão Xavier, município de Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte-MG, atividade que se estenderá por 22 anos. O grande problema é que a Mina de Capão Xavier está sobre um grande aqüífero – Ribeirões de Fechos, Catarina, Mutuca e Barreiro –, que abastece 320 mil pessoas, 9% da população de Belo Horizonte e 7% da população da região metropolitana de Belo Horizonte. Além do aqüífero, a região possui uma rica biodiversidade: animais, flora, espécies endêmicas – como é o caso de um microcrustáceo com 500 milhões de anos, um verdadeiro fóssil vivo. Na área da mina havia também grutas de rara formação, com 20 metros de profundidade, como a de Capão Xavier. Dentre as 3.500 grutas cadastradas no Brasil, existem somente seis semelhantes a ela. Os estudos de impacto ambiental afirmam que a mineração em Capão Xavier, com o rebaixamento do lençol freático, provocará um grande estrago nos mananciais ali existentes, reduzindo em até 40% a vazão dos córregos por eles alimentados. Nesse caso, a questão que se levanta é a seguinte: mineração ou água? Trata-se de uma escolha: água para consumo humano, para a flora e a fauna e para assegurar o abastecimento das futuras gerações, ou 173 milhões de toneladas de ferro de alto teor - 6,5 bilhões de reais – para a MBR (Vale do Rio Doce e seus acionistas). Em Capão Xavier, o que deve prevalecer: o interesse público ou o interesse privado? A Lei Estadual no 10.793/92 proíbe mineração em áreas de mananciais de abastecimento público. Nós, do Movimento Capão Xavier Vivo, estamos mobilizando forças, denunciando as ilegalidades e imoralidades do projeto da Mina de Capão Xavier, chamando à responsabilidade as autoridades públicas competentes e interpelando a justiça para que as leis ambientais sejam respeitadas. O nosso objetivo é defender intransigentemente a preservação dos mananciais de abastecimento público de Capão Xavier."

 

ADISTA: Por que se chegou à criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)?

Frei Gilvander: "Estão tramitando na justiça duas AÇÕES POPULARES, uma na justiça do Estado de Minas e outra na Justiça Federal, e uma AÇÃO CIVIL PÚBLICA do Ministério Público Estadual, assinada por cinco promotores, movida contra a MBR, o prefeito de Belo Horizonte e o Governo de Minas (IEF, FEAM e COPAM), COM PEDIDOS DE TUTELA DE URGÊNCIA CUMULADA COM IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Essas três ações judiciais expõem que o licenciamento ambiental concedido à MBR foi viciado e que minerar na área de Capão Xavier é ilegal e imoral. Os mananciais de Capão Xavier são fundamentais para o abastecimento da capital mineira."

 

ADISTA: Que papel você poderá ter nos trabalhos da CPI?

Frei Gilvander: "Não sei se serei convocado para depor. Em duas audiências públicas convocadas para tratar da Mina de Capão Xavier, eu discursei, sob vaias muito agressivas dos funcionários da MBR. Pela minha atuação e liderança em Minas Gerais, imagino que temam o meu depoimento."

 

ADISTA: Você tem denunciado a violência contra os sem-terra por parte do latifúndio; você tem se declarado contra o agronegócio e a monocultura do eucalipto e da soja. Qual é a situação da terra em Minas Gerais?

Frei Gilvander: "Ao iniciar o ano de 2004, no dia 28 de janeiro, os auditores fiscais do Ministério do Trabalho Nelson José da Silva, João Batista Soares Lage e Erastótenes de Almeida Gonçalves e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram executados, no município de Unaí/MG, em uma emboscada, quando cumpriam suas funções de investigar denúncias de existência de trabalhadores submetidos a condições análogas às da escravidão. Dos acusados de serem os mandantes do assassinato, Norberto Mânica encontra-se preso. Seu irmão, Antério Mânica, foi eleito prefeito em Unaí, conseguiu alvará de soltura e responde ao processo em liberdade. Eles são os maiores produtores de feijão da América Latina. Os quatros fiscais da Delegacia Regional do Trabalho, covardemente assassinados, foram vítimas do agronegócio e de quem é suspeito de submeter a trabalho escravo seus empregados.

No dia 03/05/04, 200 policiais expulsaram 14 famílias da comunidade de São Sebastião do Soberbo, município de Santa Cruz do Escalvado, da área onde está sendo construída a usina hidrelétrica de Candonga. A ação violenta, que destruiu tudo para atender ao consórcio formado pelas empresas Vale do Rio Doce e Alcan Alumínios do Brasil, provocou traumas irreversíveis nas vítimas do desrespeito e da prepotência. A expropriação de famílias que vivem em áreas atingidas por barragens é comum em Minas Gerais e em todo o Brasil.

Dia 20 de novembro de 2004, Dia da Consciência Negra, cerca de 18 jagunços, liderados pelo fazendeiro e empresário Adriano Chafik Luedy, invadiram o Acampamento Terra Prometida, em Felisburgo, no Vale do Jequitinhonha, e assassinaram covardemente Iraguiar Ferreira da Silva (23 anos), Miguel José dos Santos (56 anos), Francisco Nascimento Rocha (62 anos), Juvenal Jorge da Silva (65 anos) e Joaquim José dos Santos (65 anos). Todos os tiros foram disparados à queima-roupa. Outros 20 pessoas sem-terra foram feridos, inclusive uma criança de 12 anos, que levou um tiro no olho. Os invasores atearam fogo no acampamento, reduzindo a cinzas 65 barracas, inclusive a barraca da escola, onde 51 adultos faziam, todas as noites, o curso de alfabetização.

Esses fatos ganharam repercussão nacional e internacional, mas não são fatos isolados. Eles se inserem no bojo dos 112 conflitos no campo mineiro registrados pela CPT em 2004. Esses conflitos, além dos nove assassinatos acima referidos, foram responsáveis por 32 tentativas de assassinato, 27 ameaças de morte, 24 torturados, 75 presos e 56 feridos. Em 25/11/2004, a CPT de Minas entregou ao Governo do Estado e à Assembléia Legislativa de Minas Gerais um dossiê denunciando a existência de milícias armadas – jagunços - atormentando a vida dos sem-terra acampados em Minas Gerais. A CPT/MG também registrou 26 ataques de jagunços a acampamentos nos anos de 2003 e 2004.

Temos hoje em Minas 18 mil famílias acampadas. Em 2004, a meta do Governo Federal era assentar 4.500 famílias no Estado. Entretanto, segundo dados do Incra, só foram assentadas 2.697 famílias, sendo que boa parte das desapropriações é saldo do governo FHC. Essa situação tende a se agravar com o anúncio, feito pela Secretaria Extraordinária para Assuntos de Reforma Agrária e pela Secretaria Nacional de Reordenamento Agrário, do Plano Estadual de Crédito Fundiário, que visa atingir 3.500 famílias em 2005 e 2006. Esse programa concorre com o instrumento de desapropriação e tem sido alvo de inúmeras denúncias de irregularidades em nível nacional, com 80 denúncias por escrito e 27 inquéritos sendo investigados pelo Ministério Público."

 

ADISTA: Como está o agronegócio em Minas Gerais?

Frei Gilvander: "Em Minas Gerais, o agronegócio anda de braços dados com as mineradoras e com as empresas de monocultura de eucalipto. Por agronegócio entende-se a produção em larga escala, feita em grandes extensões de terra – latifúndios -, com alta tecnologia, uso indiscriminado de agrotóxico e, às vezes, mão-de-obra em condições análogas às da escravidão. Após devastar 90% do cerrado, a monocultura de eucalipto resseca a terra, seca nascentes, escorraça os pássaros, expulsa os sitiantes, que são obrigados a vender suas pequenas propriedades por falta de água. Na região de Unaí, Noroeste de Minas Gerais, onde é forte a monocultura do feijão, do milho e da soja, após a pulverização de herbicidas, feita por aviões em vôos rasantes, balaios e mais balaios de pássaros mortos podem ser recolhidos, vítimas de elementos altamente tóxicos, presentes nesses herbicidas, como o Round up. Há muitos municípios em Minas Gerais onde a monocultura do eucalipto já invadiu 70% do seu território.

Em 1995, dois anos antes de morrer (e ressuscitar), Manuelzão, o grande inspirador do escritor João Guimarães Rosa, homem do cerrado, ao ser interrogado se o mundo estava melhorando, respondeu com toda a sua sabedoria : "Cinqüenta anos atrás não tinha asfalto rasgando o cerrado. As estradas eram de chão batido. A gente via fileiras de caminhões de feijão, milho, arroz e mandioca indo para a capital para matar a fome do povo lá de Belo Horizonte. Hoje, 50 anos depois, a estrada está asfaltada, e o que a gente vê? Um caminhão atrás do outro, carretas e mais carretas cheias de carvão indo para a região de Belo Horizonte para matar a fome das caldeiras das siderúrgicas. Queimaram quase todo o cerrado. Pensam que eucalipto é salvação pra tudo. Quem ganha com a devastação do cerrado? Desrespeitar o cerrado é desrespeitar ao próximo, a Deus e a si mesmo.".

 

ADISTA: O Poder Judiciário também é responsável pela violência no campo?

Frei Gilvander: "Sim, pois o Poder Judiciário, em decisões relativas à questão da terra, têm se revelado, em grande parte, omisso e sem internalizar a função social da propriedade. Os juízes, na sua maioria, não assimilaram ainda o avanço constitucional da função social da propriedade da terra. Esse Poder tem se mostrado extremamente parcial ao expedir liminares de reintegração de posse contra lavradores, de áreas de titularidade muitas vezes duvidosa, inclusive contra comunidades tradicionais, que ocupam as terras há dezenas de anos. Em 2003, 35.292 famílias foram despejadas da terra. Dados parciais de 2004 indicam o despejo de outras 34.850 famílias camponesas.

Além disso, esse mesmo Poder é extremamente lento para julgar crimes cometidos contra os lavradores. Das 1.379 mortes no campo registradas pela CPT de 1985 a 2004, somente 75 casos foram julgados, tendo sido condenados apenas 15 mandantes e 64 executores. Desses assassinatos, 523 aconteceram no Pará, e só foram a julgamento 10 casos, com a condenação de 5 mandantes e 8 executores. O massacre de Eldorado de Carajás tem sido paradigmático quanto ao tratamento dos crimes contra os trabalhadores e à forma como a justiça tem agido. Dos 154 levados ao banco dos réus, apenas dois comandantes da tropa foram condenados."

 

ADISTA: Também sobre o terreno estritamente político, por que você tem se declarado contra o abuso econômico nas eleições?

Frei Gilvander: "O coronelismo político imperou, em grande parte dos municípios, nas eleições de 2004. Mais de 70% dos candidatos foram eleitos porque "compraram votos". Segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -, 9% dos votos foram comprados. A sociedade brasileira ainda não está suficientemente organizada para fazer valer a Lei no 9840, lei que introduziu no Código Eleitoral a punição pelo abuso do poder econômico nas eleições. O povo ainda não está conseguindo impedir o coronelismo político, o clientelismo e a compra descarada de votos. Muita gente sabe e até assiste à compra de votos, mas "cadê as provas"? Os filhos das trevas são espertíssimos; seduzem corações e deixam poucos rastros. Quem vê não tem coragem de denunciar, temendo perseguição. Tivemos a coragem de denunciar em praça pública, na cidade de Minas Novas/MG, o abuso econômico nas eleições e o monopólio dos meios de comunicação. Isso deixou furiosos coronéis da região.

Nas eleições de 2004 pudemos experimentar mais uma vez os limites da democracia representativa. Votar, dentro da lógica da democracia capitalista, é, em grande parte, engolir uma bola de arame farpado. Grande parte dos eleitos na democracia capitalista compra o direito de ser representante do povo, mas não é sua legítima representante. Se não formos mais fundo na crise das instituições, da democracia representativa, ficaremos sempre a reboque da superficialidade desses momentos eleitorais que mais se parecem com o tempo de Olimpíadas, Copa do Mundo, um tempo de "pão e circo". "Showmícios’, caríssimos, desvirtuam completamente o sentido dos comícios. Ao invés de expor as propostas dos candidatos, o que é priorizado é a festa e a música. Muitos candidatos oferecem "showmícios’ exatamente porque não têm propostas nem um currículo de lutas para apresentar ao povo.

A maioria dos eleitores não tem acesso às informações necessárias para fazer um discernimento mais sensato, pois a mídia está nas mãos de oligarquias econômicas e mais esconde a verdade do que a revela. Grande parte dos melhores candidatos é composta pelos que têm menor poder aquisitivo para investir em campanha."

 

ADISTA: Que lição se pode tirar das últimas eleições no Brasil?

Frei Gilvander: "O que transforma a sociedade é a luta do povo organizado, exercendo sua cidadania, na conjugação da democracia representativa com a democracia direta. Aqui devemos concentrar nossas energias. Se depender somente de eleições, podemos esperar sentados, pois as mudanças substanciais nunca virão, apenas mudanças periféricas. Povo organizado, na luta, é quem cria um outro mundo mais justo e solidário."

 

ADISTA: As ameaças contra você acontecem em um momento de grande violência no meio rural: primeiro o assassinato da Irmã Dorothy Stang, no Pará; depois, o de um ex-presidente do sindicato dos trabalhadores rurais, Soares da Costa Filho, também no Pará; o de dois sem-terra, em Alagoas; o de um líder ecologista, Dionísio Ribeiro Filho, no Rio de Janeiro, sem contar as ameaças, as intimidações, as listas das pessoas marcadas para morrer. A que se deve essa onde de violência?

Frei Gilvander: "A onda de violência se deve a diversos fatores: a) O coronelismo, b) O latifúndio, c) O agronegócio, d) a lentidão no processo de reforma Agrária, e) as terras devolutas griladas por grandes empresas, f) as monoculturas, principalmente, de eucalipto, e g) a mineração depredadora.

O coronelismo em Minas tem sido responsável por uma hegemonia política conservadora que detém grande parte do poder do Estado, seja no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário. Isso inclui o controle do Palácio da Liberdade, de prefeituras, cartórios, delegacias, tribunais e até cemitérios. No lugar dos camponeses, com sua agricultura de subsistência e de abastecimento do mercado interno, chega a cultura do boi, enchendo extensas áreas de capim.

O latifúndio, no Brasil, nasce à revelia da lei, na apropriação das terras dos pequenos posseiros, que são expulsos ou mortos. Isso coloca o Brasil em segundo lugar no ranking dos países com maior concentração de terras. Uma só propriedade no Brasil possui área maior do que o Estado de Sergipe. O Estado de Minas Gerais segue a regra nacional, com alta concentração fundiária. Essa estrutura foi mantida quando da criação da União Democrática Ruralista – UDR -, com grande força em Minas Gerais. A UDR estimula a ação de pistoleiros contra trabalhadores rurais e conta com alto grau de impunidade. Representada no Legislativo pela bancada ruralista, a UDR se organizou de forma institucional. Atualmente, o latifúndio possui novos contornos: com medo da desapropriação de seus imóveis improdutivos, esconde-se na propaganda do agronegócio.

Em Minas, o chamado agronegócio surgiu como imposição de uma política agrícola que pregava a "modernização" do campo. O objetivo era permitir que grandes empresas estrangeiras introduzissem insumos químicos no mercado brasileiro, obtendo grandes lucros e nos tornando dependentes de um "pacote" tecnológico imposto. Assim, nasce a JICA - Japan International Cooperation Agency - , com o Programa de Desenvolvimento do Cerrado – PRODECER - promovendo as atividades do complexo agroindustrial. O ecossistema do cerrado foi substituído por extensas áreas de monocultura do café, da cana-de-açúcar, da soja e por maciços homogêneos do eucalipto. Esse processo gerou exclusão social, destruição do meio ambiente e concentração de renda."

 

ADISTA: O que estão fazendo o Governo Lula e o Governo Aécio Neves em Minas Gerais? O que deveriam fazer para pôr fim a essa situação de violência?

Frei Gilvander: "Os Governos Federal e Estadual, em grande parte, têm sido coniventes com a iníqua estrutura fundiária reinante no Brasil. Grande parte dos conflitos de terra em Minas se dá em cima de terras devolutas. Além das demandas das famílias sem terra, existem no Estado 146 áreas de remanescentes de quilombos aguardando regularização. O Governo de Minas fala, mas, na prática, não tem uma firme decisão política de resgatar as terras devolutas e destiná-las à de reforma agrária. Após estudos sérios, em parceria com universidades federais, o Instituto de Terras do Estado de Minas Gerais – ITER - chegou à conclusão de que existem presumivelmente 11 milhões de hectares de terras devolutas em Minas Gerais (cerca de 1/3 do território do Estado), quase todas elas griladas por fazendeiros, reflorestadoras (na verdade, eucaliptadoras) e grandes empresas. Nas décadas de 70 e 80 do século XX, grandes extensões de terras devolutas foram repassadas para a iniciativa privada a partir de convênios firmados entre o ITER e as grandes empresas. Hoje, essas terras são usadas, quase que exclusivamente, para a monocultura de eucalipto. Muitos desses convênios estão vencidos. Muitas outras terras devolutas foram invadidas por grileiros, fazendeiros e empresas. Resgatar as terras devolutas e destina-las à reforma agrária é um desafio urgente.

O governo Federal, sob a liderança do presidente Lula, tem se limitado às desapropriações a conta-gotas para acalmar os conflitos mais acirrados. Destina poucos recursos para o programa de reforma agrária. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA - está com poucos funcionários. Lula está bastante preso às alianças políticas de corte conservador. Pior ainda: mantém a política econômica neoliberal e o pagamento da Dívida E(x)terna do Brasil - dívida imoral, ilegítima e impagável.

Enfim, a violência contra trabalhadores rurais tem origem no poder do latifúndio e do agronegócio e em uma política dos Governos Federal e Estadual que, a exemplo de governos anteriores, privilegia as oligarquias rurais, em detrimento daqueles para quem a terra é o meio de vida."

 

ADISTA: Qual a posição da Igreja?

Frei Gilvander: "Estamos recebendo solidariedade de muitos setores da Igreja Católica e de outras igrejas também. As CEBs, pastorais sociais, padres, freiras e leigos que comungam com uma Igreja que faz opção pelos pobres estão sendo muito solidários. O arcebispo da arquidiocese de Belo Horizonte, D. Walmor Oliveira Azevedo, assim que ficou sabendo das ameaças, telefonou-me, imediatamente. Após me ouvir bastante, disse: "Firmeza na luta. Conte conosco. Que a paz de Deus envolva você. Vou colocar o setor de comunicação da arquidiocese para divulgar as lutas tão importantes travadas por você. São lutas de todos os cristãos.". Dom Walmor já falou algumas vezes na Rádio América sobre as ameaças e sobre as lutas que travamos. Aliás, devo lembrar: são muitas as lideranças ameaçadas de morte em Minas Gerais. Em 2004, a CPT denunciou que havia 27 lideranças ameaçadas de morte em Minas Gerais; nove das quais foram assassinadas em 2004, ou seja, 30% dos ameaçados foram assassinados em um ano. "A verdade vos libertará", disse Jesus de Nazaré. Precisamos não apenas dizer a verdade, mas ter a grandeza de se doar por causas das verdades ditas. Sabemos que verdades incomodam, pois trazem à luz o que, muitas vezes, é tramado às escondidas com interesses escusos. Sei e sinto que quem é solidário nunca está só. Vamos continuar na luta, com a ternura e a liberdade das crianças, com a coragem e a teimosia das mulheres e dos sem-terra, com a resistência dos negros e com a mística dos nossos parentes indígenas."

 

Belo Horizonte, 29 de março de 2005.

 

Frei Gilvander Moreira, O.Carm.

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